A Educação do Passado: Análise Histórica, Impactos Presentes e Perspectivas de Transformação
- Felipe Diniz
- 25 de set.
- 9 min de leitura

Introdução
Há muita discussão sobre a Educação do Futuro, mas para compreendê-la plenamente é necessário revisitar a história e entender as raízes do sistema educacional atual. A educação formal, como a conhecemos, surgiu no final do século XVIII com o modelo prussiano, criado para servir ao Estado e moldar cidadãos obedientes, disciplinados e aptos ao novo regime social e econômico. A finalidade era evitar qualquer tipo de movimento revolucionário que pudesse emergir naquele território. Esse modelo produziu alguns benefícios (universalização, disciplina, certo grau de homogeneidade curricular), mas também impôs limites: pouca autonomia estudantil, ênfase na memorização, pouca valorização da cultura local ou da diversidade.
Este artigo explora a evolução desse modelo, seus impactos duradouros no Brasil, e discute sua relevância e contrapartidas no contexto atual, à luz de teorias críticas brasileiras, pedagogias contemporâneas e pressões sociais. Especial atenção será dada às contribuições de Paulo Freire, às metodologias ativas, e à importância de incorporar a diversidade cultural no currículo.
Origens históricas da educação tradicional
O modelo prussiano e sua difusão
O sistema educacional prussiano instituiu padrões de disciplina, supervisão estatal, currículo nacional, professores formados, separação por idade e avaliação padronizada. Essas características foram adotadas, em diferentes graus, em muitos sistemas escolares do mundo, inclusive no Brasil, no momento da construção das escolas públicas no Império e posteriormente na República.
No Brasil, entre meados do século XIX e início do XX, a estrutura escolar pública foi influenciada por modelos europeus, sobretudo franceses e prussianos, por meio da pedagogia normalista, ensino gratuito, laicidade (embora essa laicidade nem sempre fosse plena na prática). A Escola Normal aparece como um dos principais exemplos dessa estrutura.
Num primeiro momento, o principal objetivo era formar professores melhor preparados, buscando evitar que a educação primária fosse exercida por profissionais sem preparação específica, com base em improvisações. Com o fim do Império e a chegada da República, as instituições educacionais passaram por mudanças significativas no século XIX, impactando diretamente as Escolas Normais, que se transformam em sólidas instituições de preparação profissional, com cursos de 3 a 5 anos e com período de aplicação dos saberes apreendidos.
Os ideais de disciplina, rigor e modelo de autoridade prussiana chegaram também ao currículo disciplinar de colégios militares no Brasil, mostrando a força da influência da educação prussiana liberal. É possível perceber a inspiração do modelo prussiano na organização do ensino militar brasileiro, marcado por uma estrutura centralizada, hierárquica e padronizada, com ênfase em disciplina, patriotismo e mérito pessoal. Esse legado aparece em práticas como a rotina rígida de estudos, a valorização da ordem e da hierarquia, o uso de uniformes e rituais cívicos e um currículo sólido em ciências, matemática, história nacional e línguas estrangeiras.
A influência da Revolução Industrial
A Revolução Industrial transformou profundamente o mundo do trabalho, criando a necessidade de uma mão de obra alfabetizada e funcional, capaz de ler instruções, fazer cálculos básicos e compreender normas escritas. Ao mesmo tempo, as fábricas exigiam trabalhadores disciplinados, pontuais e adaptados a rotinas repetitivas, capazes de seguir ordens e respeitar uma hierarquia clara.
Nesse contexto, o modelo escolar prussiano mostrou-se ideal: uma educação centralizada e controlada pelo Estado, que organizava o tempo por meio de horários rígidos, reforçava a obediência à autoridade, separava os alunos em estruturas hierárquicas, aplicava avaliações padronizadas e cultivava comportamentos úteis à produção industrial. Assim, a escola tornou-se uma ferramenta estratégica para preparar indivíduos aptos a sustentar o novo sistema econômico e social.
No Brasil, o avanço do processo de industrialização, especialmente entre as décadas de 1930 e 1960, gerou intensa pressão social e econômica para a expansão da escolarização básica, a fim de formar uma mão de obra minimamente qualificada para operar máquinas, compreender instruções e sustentar o crescimento urbano-industrial. Porém, essa ampliação ocorreu de maneira funcionalista e limitada, com foco quase exclusivo em transmitir habilidades elementares de leitura, escrita e cálculo, sem investimentos significativos na diversificação do currículo, no desenvolvimento de pedagogias inovadoras ou na valorização da cultura e da experiência de vida dos educandos. Assim, a escola consolidou-se como um espaço mais voltado à preparação técnica e disciplinar do trabalhador do que à formação integral do cidadão.
Estrutura característica do modelo tradicional e elementos persistentes no Brasil
Características definidoras
O modelo tradicional de ensino, ainda presente em muitas escolas brasileiras, caracteriza-se por uma estrutura centrada no professor como autoridade máxima, enquanto o aluno assume um papel passivo, limitado a receber e reproduzir conteúdos. Essa abordagem mantém uma disciplina rígida, com forte uniformidade e hierarquia, e privilegia a avaliação por meio de provas padronizadas, que reforçam a memorização e a repetição em vez da reflexão crítica. Além disso, o currículo tende a ser homogêneo e pouco sensível às diferenças culturais, regionais e linguísticas, o que contribui para a manutenção de um padrão escolar distante da diversidade social do país.
Persistência no presente
Nas escolas públicas brasileiras, ainda é comum encontrar salas de aula com carteiras enfileiradas, ensino predominantemente expositivo e baixa participação estudantil, o que mantém práticas pedagógicas tradicionais. As avaliações seguem fortemente baseadas em provas e memorização, com pouca ênfase na produção de conhecimento pelo aluno, na criatividade e em projetos interdisciplinares. Embora políticas públicas recentes e documentos como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) proponham maior inovação pedagógica, valorização das identidades, da diversidade e do uso de tecnologia, persiste um descompasso entre o que é previsto nas diretrizes oficiais e o que efetivamente acontece em sala de aula.
Críticas contemporâneas: teoria brasileira
Paulo Freire: Educação Bancária vs Educação Libertadora
O educador Paulo Freire critica fortemente o que denomina “educação bancária”, modelo em que o professor atua como quem “deposita” conteúdos nos alunos, que apenas memorizam e repetem sem compreender ou dialogar. Em oposição, ele propõe uma educação libertadora e transformadora, na qual o educando participa ativamente, compartilha seus saberes e desenvolve reflexão crítica sobre a realidade. Para Freire, o processo de ensino deve partir da experiência concreta do aluno, considerando seus contextos culturais, linguísticos e sociais, em vez de impor conteúdos distantes de sua vivência. Como ele afirma, “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”, defendendo que aprender envolve interpretar a própria realidade antes de acessar o conhecimento formal.
Pedagogias ativas e tecnologia no debate brasileiro
O uso de metodologias ativas tem sido amplamente estudado no contexto educacional brasileiro. O artigo Metodologias Ativas: do contexto nacional à especificidade de um curso técnico de Edificações (Park, Souza & Oliveira) demonstra como essas abordagens podem aumentar o engajamento, a autonomia e a qualidade do aprendizado em cursos técnicos. De forma complementar, o estudo Metodologias Ativas e Tecnologias Digitais no Ensino Médio Integrado à Educação Profissional (Lemes & Domingues) explora métodos como sala de aula invertida, gamificação e aprendizagem por projetos, evidenciando seu potencial para formar estudantes críticos, autônomos e protagonistas de seu próprio processo formativo. Na Educação Básica, pesquisas também analisam o papel da tecnologia alinhada à Base Nacional Comum Curricular (BNCC); por exemplo, Lucas Almeida Silva investiga como o uso de mídias digitais em disciplinas como Literatura e Linguagens e Códigos pode apoiar e enriquecer o ensino-aprendizagem no Ensino Médio.
Relevância atual e necessidade de transformação no Brasil
Demandas do século XXI
As demandas do século XXI, marcadas por profundas transformações econômicas, tecnológicas e culturais, exigem que a educação desenvolva nos estudantes pensamento crítico, criatividade, colaboração, comunicação e capacidade de resolver problemas complexos — competências que dificilmente florescem em modelos tradicionais centrados na memorização e na passividade. Além disso, a sociedade brasileira, cada vez mais diversificada e plural, requer que a escola reconheça e valorize diferentes identidades culturais, étnico-raciais, regionais e de gênero, promovendo inclusão e equidade. Um exemplo dessa necessidade é a Lei nº 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira, buscando ampliar a representatividade e combater preconceitos por meio do currículo escolar.
Pressões e políticas recentes
Nos últimos anos, diferentes pressões e políticas educacionais têm buscado modernizar o ensino no Brasil. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada em 2017, estabelece competências voltadas à pluralidade cultural, ao respeito à diversidade, às línguas e valores sociais, além de incentivar a inclusão digital. Paralelamente, diversas iniciativas de caráter municipal, estadual e de organizações não governamentais vêm promovendo práticas como a educação antirracista, a produção de conteúdos alinhados às realidades locais e o uso pedagógico da tecnologia.
Pesquisas recentes também indicam que a integração de recursos tecnológicos com metodologias ativas está associada a maior engajamento e participação dos alunos; a Revista Educação Pública, por exemplo, destaca como a combinação entre estratégias inovadoras e ferramentas digitais tem potencial para tornar a Educação Básica mais dinâmica e significativa.
Possíveis caminhos de transformação
Metodologias Ativas + Cultura local
Um possível caminho para transformar a educação brasileira é a integração de metodologias ativas com a cultura local, tornando o aprendizado mais significativo e conectado à realidade dos estudantes. Isso pode ser feito por meio de projetos de investigação que partam de suas vivências, valorizando nomes, histórias e memórias locais, além de conteúdos como a história e a cultura afro-brasileira. Estratégias como aprendizagem baseada em projetos, problematização e estudos de caso possibilitam que os alunos investiguem questões de suas próprias comunidades, construam conhecimento de forma crítica e colaborativa e desenvolvam habilidades essenciais para o século XXI, ao mesmo tempo em que fortalecem sua identidade cultural e senso de pertencimento.
Uso da tecnologia educacional
O uso da tecnologia educacional pode potencializar a aprendizagem ao ampliar o acesso a conteúdos significativos e aproximar a escola da realidade dos estudantes. Plataformas digitais permitem oferecer aulas online, criar repositórios com materiais culturais e históricos, como conteúdos sobre a cultura e a história afro-brasileira, e disponibilizar vídeos, podcasts e documentários produzidos por comunidades negras.
Além disso, ferramentas interativas, como gamificação e recursos de realidade aumentada ou virtual, podem proporcionar visitas imersivas a museus, exposições culturais e comunidades quilombolas, enriquecendo a experiência de aprendizado. Outro aspecto importante é a produção de conteúdo pelos próprios alunos, que podem desenvolver blogs, vídeos, podcasts e publicações em redes sociais educativas, fortalecendo suas identidades culturais, promovendo protagonismo juvenil e estimulando a criatividade e a autonomia intelectual.
Formação docente
A formação docente é um elemento central para transformar a educação e torná-la mais inclusiva, crítica e conectada à realidade dos estudantes. É fundamental investir tanto na formação inicial quanto na formação continuada de professores, contemplando o uso de tecnologias educacionais, a valorização da diversidade cultural, práticas de antirracismo e abordagens pedagógicas que estimulem a participação ativa dos alunos.
Inserção de diversidade cultural no currículo
A inserção da diversidade cultural no currículo é essencial para valorizar identidades e promover inclusão de forma contínua. Isso envolve atividades permanentes, que integrem temas culturais em áreas como história, artes e literatura, indo além de datas “comemorativas”. Também é importante usar múltiplas linguagens e reconhecer dialetos, línguas maternas e memórias locais, aproximando a escola das realidades dos estudantes e tornando o ensino mais plural e significativo.
Desafios para a transformação
O modelo educativo prussiano-industrial deixou marcas profundas no sistema escolar brasileiro: padronização, hierarquia, memorização, pouca ênfase em diversidade e identidade cultural. Já não é suficiente para formar sujeitos preparados para os desafios sociais, culturais e tecnológicos do século XXI.
Autores brasileiros (Paulo Freire, estudos sobre metodologias ativas, políticas como BNCC) oferecem caminhos teóricos e práticos para recompor a educação: torná-la mais crítica, diversa, inclusiva, com protagonismo estudantil. O uso da tecnologia pode ser um catalisador potente, mas será efetivo se estiver aliado a formação docente, reconhecimento de contextos culturais, políticas públicas adequadas, investimento em infraestrutura e avaliação que leve em conta mais do que desempenho em provas.
Nesse movimento de renovação, soluções inovadoras como a da Jovens Gênios surgem como aliadas importantes para transformar a educação brasileira. Ao combinar gamificação — que aumenta o engajamento e a motivação dos estudantes — com trilhas de aprendizagem personalizadas, a plataforma favorece o protagonismo discente e o desenvolvimento de competências do século XXI. Além disso, a Formação Continuada para Professores amplia o repertório pedagógico, apoia a adoção de metodologias ativas e fortalece práticas inclusivas e culturalmente contextualizadas. Ao integrar tecnologia, acompanhamento pedagógico e valorização da diversidade, a Jovens Gênios mostra como ferramentas digitais podem ser mais do que simples suporte: podem catalisar mudanças reais no modo de ensinar e aprender.
Referências Bibliográficas
Freire, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.Freire, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.Oliveira, Luiz Antônio Mascuschi de; Santos, Maria Ivete Pereira dos. “Educação emancipadora: contribuições da teoria freiriana e das teorias histórico‑cultural e histórico‑crítica.” Revista Brasileira de Educação, etc. estudos como estes destacam o papel da teoria freiriana na crítica à educação tradicional e proposição de práticas emancipadoras. RedalycPark, Janaina Aguiar; Verônica Bernardes de Souza Léo; Adilson Ribeiro de Oliveira. “Metodologias Ativas: do contexto nacional à especificidade de um curso técnico de Edificações.” RSD Journal, n. 9(10), 2022. RSD JournalLemes, Lianza Rossella Caldeira de Lima; Domingues, Luis Augusto da Silva. “Metodologias Ativas e Tecnologias Digitais no Ensino Médio Integrado à Educação Profissional.” Cadernos de Educação Básica, IFTM, 2022. Portal EspiralSilva, Lucas Almeida. “Tecnologia, BNCC e Ensino Médio: O uso de ferramentas tecnológicas no ensino de Literatura.” Revista Carioca de Ciência, Tecnologia e Educação, 2023. Revista CariocaRevista Educação Pública. “Uso de metodologias ativas e recursos tecnológicos como inovações na Educação Básica.” (CECIERJ) Artigo, 2018‑2020. Educação PúblicaMartins Filho, Tomaz; Rocha, Damião. “Os Fundamentos da Pedagogia Prussiana Liberal: reflexões sobre o hábito disciplinar no currículo militarista.” Revista Educação e Emancipação, v.11, n.1, 2023.



